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A escritora por ela mesma

Revendo caminhos

(crônica biográfica) 

Nasci numa cidade do interior paulista, em abril de 1942. Achava o nome meio feio e, quando criança, se me perguntavam onde nasci, respondia: - Em Rancharias! Não sei porque, pensava que no plural ficava mais bonito.

Aprendi a ler bem cedo e não parei mais. Meus primeiros escritos foram lá pelos cinco anos. Pegava um papel e imitava os movimentos da mão escrevendo. Observava a mão de quem escrevia: ondulava numa reta, umas vezes ia mais para cima, outras, mais para baixo. Então eu fazia o mesmo. Depois de várias linhas ia mostrar a minha mãe, lavando roupa na tábua.  Ela enxugava as mãos ensaboadas no avental de pano de saco, pegava o papel com todo o cuidado, fazia que estava lendo coisas bonitas.

Acreditava tanto e me encantava com a minha capacidade de escrever e corria para “escrever” mais. A mãe nunca mostrou impaciência de “ler” e sempre inventava leituras novas. No dia em que deu o “clic” – depois dos esforços dela e da professora – e comecei a ler, sozinha, uma página de um livro da quarta série, minha irmã mais velha ouviu-me e foi tomada de uma alegria tão grande que gritou: - Mãe, a Nilsa sabe ler! E ficava passando uma página do começo, outras do fim e dizia-me: - Lê aqui. E aqui...

Jamais esquecerei da alegria da minha irmã e do olhar amoroso e satisfeito da minha mãe. Meu espírito e meu corpo registraram essa passagem: Leitura era alegria. Era olhar amoroso. Era satisfação. Quando meu pai chegou à noite, a mãe deu-lhe a boa nova e foi outra vez a hora de demonstrar que lia. Meu pai me mostrou três notas, dispostas nas mãos como baralho, dez mil reis, um e cinco cruzeiros e perguntou-me: - Qual vale mais? – É esta – e apontei para a de dez.

E ele, sorrindo, à luz da lamparina: - É sua!

A leitura dava dividendos. Iluminava com sorriso a face do pai cansado e muitas vezes severo. Aprendi a dar valor ao dinheiro também.

Ela, daí por diante, foi companheira constante. Minha irmã Taí, a segunda na ordem, várias vezes trazia-me livros interessantes. 

Nos meus caminhos de ensinar sempre incentivei a leitura, introduzindo-a  com prazer e alegria, fazendo dela uma ação ética, isto é,  feita por prazer ou sem dor. 

Escrevi. No meio editorial iniciei em parceria com minha amiga inesquecível, a professora Tomires Moreira de Carvalho. Com quanto entusiasmo preparávamos a coleção “Vivo e Aprendo”! Éramos sonhadoras de pés no chão. Ela se foi, deixando alegres e doces lembranças. A Editora FTD foi ampliadora de espaços e possibilidades. O Sr. Moacir Camillo, representante da Editora, foi grande incentivador para que continuasse.

Como licenciada em Ciências Biológicas não abandonei a poesia e a prosa. Naveguei nos dois lados, obedecendo às regras próprias quando a escrita científica exigia. Para mim, a ciência e a poesia podem andar juntas.